São Tomás de Aquino dizia que Deus é o grande inventor do prazer e que Ele mesmo o destinou como prêmio anexo àquelas atividades mais fundamentais e necessárias para a sobrevivência do homem, enquanto indivíduo, enquanto espécie. Segundo a sua lógica, o prazer proveniente do ato sexual é muito forte e atraente pois é dele que a sobrevivência da espécie humana depende totalmente; da mesma forma o prazer do ato de se alimentar, beber, descansar são proporcionais à necessidade que cada ser humano vivente tem deles para a manutenção de sua vida, enquanto indivíduo.
Segundo o santo, o prazer fora criado como estímulo e motivação para que a espécie humana siga para sempre na face da terra, e não se extingua por falta de quem queira se alimentar, se hidratar, se reproduzir etc. Trocando em miúdos: o prazer foi dado ao ser humano como estímulo e garantia para que determinada finalidade boa seja sempre alcançada. Nessa linha, a fonte de muitas das perturbações humanas seriam provenientes da troca dessa ordem, quando justamente se escolhe o estímulo de uma boa finalidade como finalidade em sí mesma. A essa busca feita com determinada constância, chamar-se-ia vício. Alguns exemplos são clássicos e ilustram bem esse drama humano:
• Vício de comida, chamada gula, a busca do prazer de se alimentar que dispensa as finalidades de se alimentar, quais sejam, a manutenção da vida e da saúde.
• Vício de bebida, chamada alcoolismo, a busca do prazer de beber que dispensa as finalidades de beber, quais sejam, a hidratação e a preservação da saúde.
• Vício de descansar, chamada preguiça, a busca do prazer de descansar que dispensa as finalidades do descanso, a recuperação das forças físicas e mentais para que se volte as atividades corriqueiras com ânimo renovado.
Quando uma pessoa pensa em abrir uma conta em uma corretora de valores e destina uma quantia financeira para a mesma, está pensando em uma finalidade boa e necessária para a preservação e a manutenção de sua vida, que passa pela prosperidade econômica, quer seja para garantir uma aposentadoria futura, uma faculdade para seus filhos, a aquisição de uma moradia etc. Quando ele decide operar por conta própria via um Home Broker, está chamando para sí a responsabilidade árdua e difícil de fazer render seu dinheiro, se tornando sócio de uma ou várias empresas, que naquele momento julga ter potencial de crescimento e retorno financeiro.
Que maravilhosa é a sensação daquele investidor, que via Home Broker, realizou uma operação lucrativa. A essa sensação pode-se dar vários nomes, mas a sua raiz não está fora do que chamamos de prazer. E ele é o prêmio pelo bom e inteligente ato de fazer render a economia. É o prêmio merecido que estimula o investidor a querer realizar outras boas transações financeiras e assim atingir suas finalidades almejadas.
Assim como o sexo, a alimentação, o descanso, a bebida, existem para servir ao homem e podem fácilmente passar ao caráter de escravizadores do homem quando pervertidos suas finalidades (vemos todos os dias os efeitos nocivos nos indivíduos e na própria sociedade desses vícios, nem precisamos nos extender nos exemplos), assim também as operações financeiras podem passar de serviçais do homem para escravizador do mesmo. E não é difícil. Basta que o investidor esqueça por um segundo da finalidade de sua presença na bolsa e se deixe aventurar na busca do prazer do lucro rápido e fácil e inconsequente. Muitas vezes o vício do Home Broker não apenas escraviza o investidor, mas acaba com a sua vida por inteiro.
O sintôma mais claro de que uma pessoa está viciada pelo Home Broker, opinião meramente pessoal, é quando esta chegou no dia 31 e percebeu que pagou uma mini-fortuna em corretagem e não conseguiu render nada para sí mesmo, e assim mês após mês. Essa pessoa trabalhou para a sua corretora, ficou nervoso, perdeu cabelo, e não levou nada (é claro que há casos em que uma sequência de trades bem estudados e planejados possam ter sofrido com inúmeros "stop loss" numa reversão de tendência de mercado, ou algum outro evento inesperado como uma quebra de banco global etc, o que é sem dúvida mais raro). Um verdadeiro escravo, que só fez trabalhar para terceiros, e não levou nada. Ou se fez, pelo excesso de giro financeiro, acabou deixando tudo.
O fato de abrir o Home Broker e "estar" na bolsa é para ele uma necessidade, pois se habituou tanto a degustar o prazer da adrenalina da aventura da renda variável, que não consegue simplesmente desgrudar os olhos das cotações piscantes sem antes enviar uma ordem de compra ou de venda. A finalidade de fazer render suas economias, com inteligência, estratégia e disciplina e método agora pouco importa, o que importa é sentir o coração pulsar e deixar a imaginação o levar para os louros e as glórias dos ganhadores da mega-sena. Se faz ou não faz sentido comprar ou vender naquele específico momento de mercado, naquela determinada empresa, naquele tipo de operação, também em absoluto importa, afinal, para este viciado o que conta é obedecer seus impulsos de aventura financeira.
O vício do Home Broker vai aos poucos dominando tanto este investidor bem intencionado, que almoçar já não é possível, atender as necessidades dos amigos ou da família fica transferível, trabalhar (caso trabalhe fora do mercado financeiro) se torna impossível e viver fica sofrível. Por fim, o escravizado fica sem comida, sem descanso, sem família, sem amigos, sem trabalho, sem dinheiro. Operações de altíssimo risco em derivativos e micos especulativos que surgem como alucinações de redenção, acabam por enterrar o coitado. A finalidade boa de ingressar na renda variável agonizou (trocado pelo prazer/impulso de comprar pelo comprar, vender pelo vender), e os meios (método, estudo, disciplina, estratégia, gerenciamento de risco e paciência) para alcançar aqueles bons sonhos por qualquer um desejáveis, debruçou desolado num recanto qualquer de algum manual de investidor.
"O prazer de se aventurar pode causar dependência", acredita o neurologista Ésper Cavalheiro, da Universidade Federal de São Paulo. Essa constatação não vale só para o perigo de experimentar esportes radicais. Segundo o neurologista, o desafio de escrever um livro ou o de investir milhões no mercado financeiro são versões intelectualizadas da corda bamba que encanta os equilibristas."
""Se o indivíduo assume riscos desnecessários e se irrita quando precisa alterar sua rotina, tem uma patologia", afirma o psiquiatra Táki Cordás, da Universidade de São Paulo. Nesses casos, o melhor mesmo é procurar um médico." Loucos por Adrenalina, Revista Epoca , no. 31
""Se o indivíduo assume riscos desnecessários e se irrita quando precisa alterar sua rotina, tem uma patologia", afirma o psiquiatra Táki Cordás, da Universidade de São Paulo. Nesses casos, o melhor mesmo é procurar um médico." Loucos por Adrenalina, Revista Epoca , no. 31
É verdade que bolsa tem todo dia, mas compra e venda inteligente não. Operações boas, de potencial, que valem a pena, são poucas e não são descobertas por todo mundo todos os dias. Essas exigem estudo, disciplina, método, paciência, virtude. O mundo da renda variável, especialmente acessada via Home Broker, precisar ser constantemente retificada pelo investidor para que continue sempre como mera ferramenta para alcançar as boas finalidades da economia, a serviço do homem e para ele voltada, e não se torne vício que acabe por dominar esse mesmo homem e assim destrua sua vida e os em sua volta por completo. Bolsa de valores boa, é bolsa de valores direcionada para uma boa finalidade, com resultado e prazer coroando o profissionalismo utilizado.
Como diria Warren Buffet, as vezes, operar é fazer nada.
Meu Gráfico Amigo
Obs.: Se você se identificou com esse artigo, talvez seja uma boa hora para parar, sair do mercado por algum tempo, refletir, traçar novas metas de organização e disciplina, e pouco a pouco ir voltando com mais controle emocional, saúde mental e paz interior.